Japa mala



Nunca antes uma palavra parece ter durado tanto tempo em minha cabeça. Você disse, "Eu não vou lhe desapontar". E a obsessão em mim, no uso da palavra, ganhou novas proporções. Por que o que eu faço da vida senão desapontar? Eu mesmo tratei de gastar cada minuto dedicando-me ao revés da lapiseira, desapontando o rabisco inconcluso de minha biografia. Desejo força, inclusive, aos que perseguem a busca pela verdade! Creio que isso também me ajudará a saber “de onde venho e pra onde vou”. Mas, a mediocridade já vai instaurada e costumeira. A lapiseira cega deixa a escrita em traço duplo, parece desacertado e belo. 

Apontaram-me o caminho e isso já vai torto há quase três décadas. “Ponha o dedo na minha cara e eu quebro seu dedinho!”. “Aponte para onde quiser, a ponte é o braço do mar com a mão da maré”, canto melhor que o Lenine, juro que canto. Fanho é mãe!  ...e a maioria dos cantores brasileiros. Sempre me lembro dos apontamentos para uma vida feliz, “use sempre fio dental e bloqueador solar”, “plante uma árvore”, “decore seu poema favorito”, “trabalhe com aquilo que gosta”... blá blá blá. Em vez de empurrar com a barriga, queria mesmo alavancar as coisas A PONTAPÉS. De um bicudo só, em pontaria certeira, me colocaria cara a cara com a linha de chegada. Seu atrevimento me fragilizou no passado, “Não existe vento favorável para quem não sabe o porto onde quer chegar”. No passado?

“DESAPONTAR” por uma questão lógica deveria ser algo belo. “Você me desapontou e eu te amo muito por isso". Não se deve apontar. Apontar é feio! O dedo indicador, o dedo inquiridor, o dedo desafiador, o dedo atrevido e mundano não deve tocar o terço dos seguidores de Krishna. Dedo feio, dedo sujo não toca o “japamala”. Isso mesmo, o poder de interiorização e transformação através do mantra não permite que o dedo indicador se interponha na parada. Repita comigo 108 vezes, 54 vezes, 27 vezes (simplifique sua vida): “Eu sou eu e licuri é coco”. Funciona mesmo! 

Vou lhe dizer três coisas. Primeira, NÃO GOSTO DE SER APONTADO. Segunda, ME ERRE. Terceira, EU SOU EU E LICURI É COCO. Esse japamala é um ótimo escape. Eu sou eu e licuri é coco, eu sou eu e licuri é coco, eu sou eu e licuri é coco... Eu fui um guri de olhos puxados e gostava de raspar a cabeça deixando os cabelos espetados ao estilo “Dunga”. Na 5ª série, uma professora me disse assim, “Você parece um daqueles japoneses da máfia, que a gente vê nos filmes”. Que observação sensata! Que mulher 
futurista! Esse sou eu, um japa mala. De lá pra cá, tenho levado a vida com golpes de artes marciais, já provei sushi e sashimi e bebo cachaça até de arroz. Já já quebro a regra mínima da matemática da repetição ritualística, repetirei meu nascimento pela vigésima oitava vez. Se fiz bom ou mau proveito, não é da sua conta. Olha a voadora! Vai querer contar estrelas? Conhece verruga? Acho bom.

Aqui vai um conselho, seu “dedo podre”: PARE DE TOCAR O MUNDO COM O DEDO INDICADOR. Hare!


2 comentários:

  1. Rapha, maravilhoso como sempre! Genial.

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  2. Obrigado, Karem! Você sempre atenciosa à causa literária. Incentivo certo. ABREIJO :)

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