Não vou deixar que me deixe!, Relutava Cristina, mordendo os lábios e andando de um lado para o outro em desesperadores 'tocs tocs'. E quem falou em te deixar?, exaltava-se Marcos, que com as duas mãos deslizando simultaneamente na face - da testa em direção ao queixo - deixava aparecer o vermelho da parte interna dos olhos cujas pupilas quase sumiam.
E assim permaneciam. Cristina, antecipando angústias. Marcos, perplexo. Ambos aflitos. Tinham vontade de um abraço apertado acompanhado de um beijo, daqueles bem intensos. Queriam mesmo, era colar as pontas dos narizes: Ele sentindo tocar em algo fofo e redondo, ela em uma pontinha perfeitamente afilada. Eram como imãs, esses dois. Podiam sentir a força que os atraía, num simples esbarrar acidental de braços. Mas sinergicamente, não podiam se aproximar. E os músculos ficavam sempre tensos.
Nunca dariam certo. Obviamente, não arriscariam - ao menos Cristina não - uma nova decepção. Amava-o demais, a moça, para arriscar perder. Preferia guardar os cheiros, sensações e frases de amor numa caixinha, para vistar sempre que preciso. O charme da atração era irrenunciável. Queria lembrá-lo em notas musicais, em ócios e coca-colas. Queria a memória dos dentes brancos, da boca levemente torta para a esquerda, das sobrancelhas densas e dos olhos tímidos. Bastaria fechar os olhos. Tinha a lembrança na ponta do dedo indicador. Captara, sem que ele percebesse, em toques suaves na face.
Os corações haviam se encontrado à tempos. A pele, a carne e os instintos clamavam. Mas todo o resto não. Dessa vez, seria a razão. De certo, não haveriam abandonos. Porque não houvera encontro. Ao menos em nossa verdade inventada. Universo e suas energias, em total conspiração. Imensidões de segredo. Boomerang nas mãos do destino: voltas, voltas, e paradas no mesmo ponto. Realidade paralela, a que tinham inventado. Era hora de descer da espaçonave, voltar e viver o possível. Sabíamos que esqueceríamos. Só não tínhamos certeza de por quanto tempo.
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