Não costumo e nem quero fazer resenha de filmes, apesar de assisti-los com frequência. Mas não conseguiria dormir hoje sem indicar o maravilhoso The Help (lançado no Brasil como "A resposta" em 2012). A obra cinematográfica, inspirada no best seller homônimo da escritora norte-americana Kathryn Stockett, retrata de
forma sensível e envolvente a vida das empregadas domésticas negras do
Mississipi na década de 60.
A trama se desenvolve em um contexto de escancarada
segregação racial, época em que despontaram diversas revoltas populares. A
sociedade negra, considerada 2ª classe, era
impedida de frequentar normalmente escolas, universidades ou qualquer outro
ambiente destinado aos brancos em alguns estados. A manifestação mais famosa -
e citada, sutilmente no filme em comento - foi o Movimento dos Direitos Civis
dos Negros (1955-1968), que almejava reformas que abolissem todas as cruéis
formas de discriminação no país. As "pessoas de cor" clamavam,
principalmente, pela famigerada dignidade racial, até então muito distante.
É nesse pano de fundo, que sensibilizada com o comportamento notadamente racista das jovens senhoras de sua idade, a aspirante à escritora Srta. Skeeter (Emma Stone) planeja escrever um livro que retrate a latente hostilidade racial. O diferencial, entretanto, seria a perspectiva a partir da qual a história seria contada: as próprias negras relatariam as suas dolorosas, curiosas e engraçadas experiências através de depoimentos feitos em segredo à jovem jornalista.
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Cena do filme com as protagonistas e narradoras,
Emma Stone, Viola Davis e Octávia Spencer
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A obra cinematográfica nos convida à uma profunda reflexão. Costumes até então vistos com naturalidade têm seu viés preconceituoso desmascarado durante todo o enredo: o banheiro dos fundos reservado aos empregados, os talheres, copos e pratos diferenciados ou a proibição tácita de sentar à mesa junto aos patrões. O expectador, à essa altura, inevitavelmente embarca em uma viagem que percorre a própria história e a de familiares ou amigos.
Pare e pense: Das domésticas que você teve em casa, quantas eram brancas? Quantas utilizavam o banheiro social - mesmo com a existência do de serviço? Quantas sentavam à mesa junto aos patrões durante as refeições? Quantas usavam os pratos e copos mais chiques?
Embora eu precise admitir o progresso nos últimos anos, a realidade atual ainda guarda estreita semelhança com a de décadas atrás. Não é difícil visualizar uma época em que empregadas - geralmente negras, passavam mais tempo com os filhos dos patrões do que eles próprios. Além disso eram estrategicamente acomodadas no minúsculo quartinho dos fundos, usando o pior/menor banheiro da casa. Isso para não citar a forma quase escondida com que são obrigadas a transitar até hoje. Inconvenientes e impróprias aos olhos, são orientadas a entrar da maneira mais discreta nas casas e apartamentos: pela porta dos fundos.
No Brasil, apesar da nossa belíssima Carta Magna assegurar valores como igualdade e dignidade a todos os cidadãos, só agora, babás, faxineiras, jardineiros, copeiros, caseiros, porteiros, governantas, cuidadores de idosos, mordomos e cozinheiros gozam de amparo legal para buscar os mesmos direitos dos demais trabalhadores. Isso deixa claro o quanto apesar de parecer superada, a questão da segregação ainda tem sido mais atual do que gostaríamos.
Os temas que envolvem as empregadas domésticas ou preconceito renderão muitos outros textos. São assuntos extensos, complexos e cheios de sinuosidades. Por enquanto, fica aqui a minha humilde indicação de filme. Assistam! Vale a pena.
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