Camuflagem educacional: onde chegaremos?

No caminho com Maiakóvski
Na primeira noite eles se aproximam e roubam uma flor do nosso jardim.
Na segunda noite, Já não se escondem; pisam as flores, matam o nosso cão, e não dizemos nada.

Até que um dia o mais frágil deles entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a lua e, conhecendo o nosso medo, arranca-nos a voz da garganta. E porque não dissemos nada, Já não podemos dizer nada.
(Eduardo Alves da Costa)

Primeiro foram as cotas para negros: o furor tomou conta das classes média e alta. Falava-se em dívida cultural, preconceito e pobreza quase que como estigma da cor. Almejava-se uma solução prática e imediata para a inclusão das pessoas de cor em universidades. Esqueceram dos pretos ricos e dos que tinham tido as mesmas oportunidades que os brancos. Mas tudo bem: o prejuízo de alguns era por motivo nobre (e seria só por um tempo, segundo o que diziam).

Criaram ainda as cotas para escola pública: O ensino gratuito era de má qualidade - admitiam - e para que os jovens vitimados pelas péssimas condições de aprendizado não saíssem tão prejudicados, seria criada uma cota para que fosse 'suprimida' a carência de conhecimento desse grupo de estudantes em detrimento dos demais - estudantes de colégios particulares. Seriam 50 metros de vantagem na corrida de 100 metros rasos. De cara, pareceu injusto. Mas quem discordou foi chamado de elitista. Eu entendi o caráter emergencial da medida: por pouco tempo não faz mal, pensava. Tinha a crença ilusória de que enquanto alguns estudantes capazes eram esmagados pelas cotas pelo bem de uma maioria desprivilegiada, o governo "corria" nos projetos de melhoria para educação de base.

Doce engano. Em que pese a existência de mil e uma propostas de melhoria, de diversas ações de icentivo à professores, acesso facilitado à tecnologia e várias reformas nas instituições de ensino, o governo tem falhado, ou pelo menos os avanços não têm ocorrido na velocidade desejada. Mas ninguém quer assumir a culpa e atitudes desesperadas estão sendo tomadas.

"Se não consegue vencer o inimigo, junte-se a ele", tem sido o lema do MEC, a meu ver. O ataque à língua portuguesa foi baixo: colocou o nosso idioma pra dormir. Presumem que estamos em estado de abestalhamento? 

Um livro de português aprovado recentemente pelo MEC, tenta demonstrar ao aluno que não há necessidade de se seguir a norma culta para a regra da concordância. Os autores usam a frase “os livro ilustrado mais interessante estão emprestado” para exemplificar que, na variedade popular, só “o fato de haver a palavra os (plural) já indica que se trata de mais de um livro”. Em um outro exemplo, os autores mostram que não há nenhum problema em se falar “nós pega o peixe” ou “os menino pega o peixe”.

  • Leia o resto:



Problema em falar não há, realmente. Eu mesma, cometo erros de concordância diariamente.  São os famosos 'vícios de linguagem'. Mas uma coisa é certa: todas as manhãs, ao redigir as minhas peças processuais preciso estar a par da norma culta da língua. Não vale dizer "Os réu cometeu os crime de furto e resistência".  Dói no ouvido, não é? 

Para que precisaríamos frequentar a escola e aprender a língua portuguesa em livros se fosse certo e bonito falar errado? Um bebê se comunica através de grunhidos, sílabas soltas e gestos. Analfabetos, que nunca, obviamente, frequentaram a escola sabem falar muito bem. Ambos fazem-se entender, mesmo sem saber escrever ou ler. Isso se chama "comunicação".  Mas daí, a induzir estudantes a falar errado no ÚNICO ambiente onde muitos têm a oportunidade de ouvir e ver a língua  de maneira correta já é demais.

Estariam querendo nos convencer de que a falha na educação gerou o que podemos chamar de "novo português" ?  A idéia é camuflar os problemas. Não, MEC. Falar "os menino pega o peixe" não é nada bonito. Tampouco soa como certo. As cotas nós aceitamos, apesar dos protestos. Os pro unis também. Mas agora, sinto um ar fúnebre: Decaptaram a nossa língua.

Ensinem os alunos da rede pública a escrever. Encham as barrigas deles com comida de qualidade. Proporcionem carinho, lazer, assistência psicológica. Livrem-se do autoritarismo. Estimulem a leitura. Façam qualquer coisa, meus caros: menos a gente de besta.



-> Leia também:

"We need education"
http://naoestouestudando.blogspot.com/2009/10/we-need-education.html

5 comentários:

  1. Se não fosse trágico, seria cômico.
    :|

    Parabéns pelo por este e pelo "We need education". Muito lindo! Do tempo em que Educação tinha gosto de lanche e de recreio.

    :*

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  2. Vou iniciar meu comentário com um "Nossa!" Que massa teu Blog!
    Confesso que li só alguns textos, e olha, (não sei se foi só comigo) você consegue prender a atenção de quem está lendo os teus textos. Você escreve bem. Admiro pessoas críticas, mas honestas, não aquelas que criticam simplismente por não gostarem de algo. Boas são as críticas construtivas. Gostei muito, muito mesmo do teu Blog!
    Vou te seguir, se quiser me seguir, esse é o meu: http://entaodane-se.blogspot.com/
    Beijos ;*

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  3. Lívia fiquei surpresa em saber que a nossa Gramática está dramática, que me perdoem o trocadilho.Quanto descaso com a intelectualidade.



    P.S. mas só pra alegrar o momento quero falar das suas fotos, são lindas! Também quero um ensaio!

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  4. Eu concordo plenamente com seu texto. Querem nivelar a educação ao nível mais baixo, se é que posso dizer assim. Muda-se a gramática porque a língua portuguesa é muito confusa. Erros tornam-se normais porque a variação linguística já se tornou normal e por aí vai. O problema é que o MEC só se preocupa com números: quantos alunos estão na escola, quantos professores estão em sala de aula, aquela velha história de fazer as coisas "pra inglês ver", e a questão da qualidade é sempre deixada de lado. É mesmo uma pena que uma língua tão bonita seja desmoralizada dessa forma pelos seus próprios falantes.

    Olha, vou seguir seu blog porque achei muito interessante e inteligente. Parabéns!

    www.maisquelimao.blogspot.com
    www.meu-lar1.blogspot.com

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