Favor, não 'bulir' com ninguém.



Não vou aqui discutir massacres, barbaridades, culpa, razão ou justiça. As últimas tragédias deram conta de instigar debates com os mais variados focos pra lá de batidos. Porém, dentre os temas mais comentados eu não poderia ter deixado de reparar no tal bullyng.

O termo surgiu a pouco tempo e já ganhou espaço no ciclo acadêmico. Psicólogos, pedagogos, alunos e pais se desdobram pra explicar o que só eu e talvez você aí atrás da tela - gordinho(a), tímido(a), magrelo(a), orelhudo(a), espinhento(a), nerd, negro(a) - podemos entender. 

Sim, eu fui vítima de bullyng quando criança e pré-adolescente. E digo a vocês, meus caros: é bem mais difícil do que você, que nunca sofreu essa moléstia, possa imaginar. 

Posso dizer sem medo que, as humilhações pelas quais as criancinhas tidas como tão puras me fizeram passar, deixaram marcas profundas, das quais eu nunca consegui me livrar. Tomaram sem dó o sorriso que eu me dava de presente através do espelho todas as manhãs, naquele tempo. 


Sofri diversos tipos de bullyng: por ser magra, por ter orelha de abano, por ter a testa grande e acreditem: até por ser dona de um - belo, pra muitos - par de lábios carnudos. Entretanto, o mais marcante e pior bullyng da minha vida foi quando fui chacoteada durante meses a fio. Era cruelmente chamada pelo nome de uma personagem de novela. Detalhe: a personagem era MUITO feia.

Não podia andar pelos corredores do colégio - principal ambiente social de uma pessoa de 13 anos - sem ser chacoteada, olhada, apontada. Lembro em detalhes da sensação de dor, do afastamento dos "amigos" e da solidão, sobretudo. 

Em tempos de paqueras, flertes, lanches da cantina, conversas animadas e risos, lá estava eu: na capela da escola, focando no azul do altar para não enloquecer, tamanha a agonia e tristeza. Minha mãe já não aguentava: ver sua única filha chegar em casa banhada em lágrimas era uma constante. Lembro que na tentativa de ajudar aconselhava com certa revolta: dê uns tabefes naquela menina, Lívia. Não seja covarde. Mas esse era o problema: de mal,  bastava o que me faziam. 

Naquela época, lembro que a primeira fase foi a inércia. Eu sofria calada, chorava silenciosamente, pra não dá mais um motivo para a zoação. Tive medo. Medo de falar, de me abrir. De piorar tudo colocando a boca no trombone. Virei um fantasma naquela instituição. Desejava com todas as forças que o meu nome fosse apagado da chamada. A última coisa que eu queria àquela altura, era chamar atenção. 

Depois, não sei por qual motivo, a coisa mudou de rumo: tive forças pra tentar reagir. A primeira reação não foi reclamar, não foi levar o problema para a diretora do colégio ou para os pais da menina cruel que tinha sido a responsável pela proliferação de um apelido tão cruel. Eu tinha sede de vingança.

 Digo sem ter vergonha, que com as proporções que uma mente normal de uma menina de 13 anos, o que eu queria era ver a cabeça da causadora de toda aquela dor em bandeja imaginária. Não desejava mal físico, mas psíquico. Queria toda aquela humilhação, depreciação e solidão pra ela - que era má - e por isso merecia passar por tudo de ruim. E consegui.Comecei a abrir a boca. Joquei todo o mal caratismo daquela, que me roubara dias que deveriam ser felizes na sétima série,  no ventilador.

Contei a todos que pude todas as coisas horríveis que a tal menina já tinha feito e espalhado sobre outras pessoas. Desnudei aquela mini mente vil. Dentro de poucos meses vi minha vida ir voltando ao normal, fui conquistando novos amigos, ao tempo que assistia de camarote o declínio da causadora de todo aquele transtorno pelo qual eu tinha sido obrigada a passar, sem nada ter feito de mal. 

Falando assim, parece exagero. Quem nunca sofreu essa prática, vai imaginar: tadinha, devia já ter problemas. Mas eu digo: na infância, quase não temos problemas.

A grande preocupação é a formação da imagem que temos de nós mesmos e como a expressaremos para os outros. É na pré-adolescência que passamos a enxergar defeitos e qualidades com mais firmeza. Traumas nessa época, podem ser irreversíveis na formação da personalidade e da auto-estima da pessoa adulta.

Existem bullyngs dos mais variados níveis de gravidade. Até os 13 anos eu tinha aguentado até bem todos eles. Tinha uma vida normal apesar de ocasionais comentários maldosos. Mas depois desse acontecido, que realmente teve proporções desastrosas, eu sucumbi. As pessoas têm limites. Isso poderia ter passado sem grande destaque na vida de qualquer um, mas não na minha que era uma menina tão vaidosa e cheia de sonhos cinderelescos.

Que fique o alerta. Registre-se aqui, a minha solidariedade a todos que, como eu, passaram e passam por tantas situações vexatórias. A vocês, que praticam bullyng sem pensar nas consequências, cuidado: violência, gera violência. Não é de se estranhar que pessoas sem apoio da família ou psicológico se tornem criminosos um dia. Em que pese certos traumas não justificarem tantos crimes, é certo que a dor ocasiona sentimentos de vingança dos mais profundos. Que tal se não provocássemos?

Ah! antes que eu esqueça, no meu caso a história tomou um rumo feliz: A maioria das pessoas acabou esquecendo o tal apelido constrangedor (que até hoje, vejam, me recuso a pronunciar) e eu não tive grandes problemas. Vi que não era feia como falavam. E apesar de a auto-estima nunca mais ter sido a mesma, sempre namorei normalmente, mais que muitas das pessoas que me humilharam. Hoje não tenho mais raiva da mocinha que me causou todo o transtorno. Reconheço que quem se dispõe a um papel desses, na certa, tem problemas de ordem emocional, dos quais eu aprendi a ter pena. 

Que a sociedade tenha mais sensibilidade. Que os professores observem os seus alunos. Que os pais saibam detectar os sinais de agressão. Que a infância e a juventude seja resguardada de todos esses males desnecessários. Finalmente, que ninguém seja privado das alegrias da melhor fase da vida. 

Amizade: passe adiante. Diga não ao bulling.



3 comentários:

  1. Também fui vítima de bulling, também já passei intervalos na capela. Sei bem dessas coisas, e também soube, muitos anos depois, reverter o quadro. O bulling é um pandemônio perverso, e todas as empreitadas contra a prática são nobres. Pedagogos, psicopedagogos professores e família são os mais importantes agentes de transformação desse cenário que atinge instituições públicas e privadas, indiscriminadamente. Reverter esse mal é prevenir a construção de homens e mulheres preconceituosos, soberbos e cruéis para com os semelhantes. Praticar, exercitar e transmitir respeito é a única via de solução social.

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  2. como vc disse no meu blog, realmente, pensamos igual rsrs
    gostei muito mesmo *-*

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  3. eu já sofri mt bullying, mas eu posso lhe afirma - lhe que cresci uma menina revoltada e sem vontade nenhuma de viver.

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