Como todos já devem saber, sou bonfinense. E o carnaval, nos meus tempos de menina, era algo muito esperado. Nada de baile de máscaras ou fantasias (essa parte, ficava para as animosidades do colégio). O que agitava mesmo, eram os famosos carnavais de rua. Não falo de bandas elaboradas, cantores em trios ou nada do gênero. Me refiro a populares, com tambores improvisados, contagiando a todos enquanto subiam e desciam as ladeiras dos bairros da cidade.
Como tudo no Brasil acaba tendo uma pitada de folclore, a bandinha sempre era seguida do "bumba meu boi" (que causava um misto de terror diversão às criancinhas) e de mascarados jocosos. A simplicidade e irreverência daquelas pessoas faziam a minha alegria. Lembro de como os moradores saíam às portas de casa para ver aquela muvuca passar, ao tempo que temiam serem vítimas de alguns dos trotes típicos.
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| Boi-Bumbá ou Bumba meu boi. |
Uma das principais brincadeiras bonfinenses - e de algumas cidades por todo o Brasil - é a secular "guerra de maizena". O jogo consiste em atirar o pó branco nos transeuntes ou mesmo nos companheiros de farra. A princípio, parece uma tradição boba e até ofensiva à integridade das pessoas. Mas é só voltar ao passado e encontrar as raizes históricas interessantíssimas que guardam este e outros jogos carnavalescos.
O entrudo - assim chamado o costume de brincar no período do carnaval - foi introduzido no Brasil pelos portugueses. Os gracejos eram os mais variados, merecendo destaque a famosa "guerra dos limões". O limão-de-cheiro era a grande arma da brincadeira, produzida artesanalmente por famílias inteiras que se dedicavam à fabricação durante várias semanas. Tais artefatos, eram confeccionados com cera e continham num reservatório interno (água ou urina), que as pessoas jogavam umas nas outras. Há relatos de que algumas famílias usavam fuligem de panela, farinha de trigo e tinta, travando verdadeiras "competições", que ajudavam a criar laços sociais mais intensos.
Naquele tempo, o carnaval também era forma de subverter o cotidiano. Os entrudos além de representarem diversão entre as famílias, possibilitavam a expressão dos setores pobres da sociedade - inclusive os escravos - que usavam a "licença poética" do momento de folia para protestar contra as desigualdades.
O que noto nos dias de hoje? O carnaval perdeu um pouco da sua função social. A indústria do carnaval, que movimenta cerca de 1 bilhão de reais (dados de 2006) por ano e gera algo em torno de 300 mil empregos temporários virou, em grande parte, uma atividade relacionada à obtenção de lucros. É lógico que dançar, cantar, beber e ainda ganhar dinheiro e empregos com isso também é legal. Mas o prestígio à cultura brasileira deve ser interesse imperioso da população. Não vamos deixar que os dias de folia se tornem apenas artifícios políticos e das classes dominantes para o famoso " pão e circo". Não podemos fechar os olhos para as festas excludentes, onde só quem pode pagar têm direito à diversão com segurança. Algumas vertentes carnavalescas hoje, são verdadeiros agentes de segregação de classes. Aonde está o caráter popular e democrático da festa?
É isso. Que o carnaval não seja só cerveja e diversão sem sentido. Que consigamos aproveitar o momento de integração e alegria para repensar alguns valores perdidos. Só sei que não lembro tão bem, sem o auxílio das fotografias, do que vesti ou o que dancei a 15 anos atrás. Mas lembro, como se fosse hoje, do meu carnaval de maizena e bois-bumbás.
É isso. Que o carnaval não seja só cerveja e diversão sem sentido. Que consigamos aproveitar o momento de integração e alegria para repensar alguns valores perdidos. Só sei que não lembro tão bem, sem o auxílio das fotografias, do que vesti ou o que dancei a 15 anos atrás. Mas lembro, como se fosse hoje, do meu carnaval de maizena e bois-bumbás.














DE RICARDO RAMOS
ResponderExcluirGostei muito! Minha irmã escreve bem, tem excelente organização das idéias, domina o conteúdo histórico e principalmente tem a sensibilidade e um perspectiva bem realista da cultura regional...
odiava a maizena...eca... mas sempre entrava na "guerra"... e no fim passava horas tirando todo o pó do cabelo e orelhas... uma graça!!..adorei o texto, Bem bonfinese... nossa terra, nosso povo!
ResponderExcluire pra variar..
tb nao estou estudando!
Ahhh...o boi bumbá, uma espécie de "esquenta" pré-carvanalesca.
ResponderExcluirAcho que estamos ficando velhas demais, ou nossas crianças estão ficando maduras demais....
mas se criarem um game com boi bumbá e guerra de maisena, irão ganhar muito dinheiro.
fora do virtual carnavais assim estão quase em extinção.
Obrigada por me proporcionar tamanha nostalgia.